Frota carioca emitirá, só este ano, 3 milhões de toneladas de CO2
Daniel Engelbrecht
Com um crescimento médio da frota de cerca de 5.500 veículos por mês, a cidade do Rio atingiu este ano a marca de dois milhões de automóveis cadastrados no Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam). O número é a metade do total do estado e representa aproximadamente um veículo para cada três habitantes.
Apesar disso, o município não recebe obras viárias de grande porte desde 1997, quando ficou pronta a Linha Amarela, e carece de investimentos em transporte público. Para especialistas, o prognóstico para os próximos anos é de aumento progressivo dos congestionamentos, embora um cenário de caos como o de São Paulo ainda esteja distante.
Os dois milhões foram atingidos em março.Em julho, o município já contabilizava 2.025.928.
Para efeito de comparação, a cidade de São Paulo tem 5.804.291 veículos, mais que todo o Estado do Rio. A maior parte da frota do município é composta por carros de passeio: 1.640.600 (dados de julho). Em seguida, vêm as motos (142.570); as caminhonetas, que são carros destinados ao transporte de passageiros e carga no mesmo compartimento, como a Parati (118.429); e as caminhonetes (31.956). O bairro com mais veículos é a Barra, com 125.899, ou cerca de 6% do total. A estimativa do Detran-RJ é de que 80% do total de veículos da cidade estejam em condições de circular.
Av. Brasil já recebe mais de 200 mil veículos/dia
Nos últimos seis anos, de julho de 2001 a julho de 2007, a expansão da frota do Rio foi da ordem de 23%, ou cerca de 5.500 novos veículos por mês. O crescimento ainda é considerado modesto.
Para o professor de engenharia de transportes da Uerj José Guerra, a tendência, no entanto, é de aumento, devido à ampliação do poder de compra dos salários e das vantagens de crédito oferecidas pelas concessionárias.
— Não há dúvidas de que a indústria automobilística nacional tem alcançado patamares de produção e venda que há alguns anos não se viam no Brasil. Hoje é possível comprar um automóvel em mais de 48 vezes, o que, há cinco anos, era impossível — diz.
Foi esse tipo de vantagem que permitiu ao jornalista Thiago Braga, de 25 anos, adquirir em junho seu primeiro carro, um Fiat zero quilômetro.
O pagamento será feito em cinco anos.
— Eu queria há bastante tempo ter um carro, mas não via como conseguir. Até que surgiu a oportunidade de comprar em 60 parcelas, sem entrada — diz ele.
Se, por um lado, os carros trazem comodidade para seus donos, por outro, o excesso deles está associado a diversos problemas. O principal é o aumento do fluxo de tráfego, com as conseqüentes redução da velocidade média nas vias e ampliação dos congestionamentos.
Principal corredor de tráfego da cidade, a Avenida Brasil já recebe, em boa parte de sua extensão, um volume superior a 200 mil veículos por dia. A Avenida Presidente Vargas, no Centro, vem logo atrás, com 191.816 veículos diariamente, na altura do prédio dos Correios. Na Barra, a Avenida Ayrton Senna é a campeã de tráfego, com 148.554 automóveis passando por suas pistas todos os dias, nas imediações da Avenida Abelardo Bueno. Na Zona Sul, é a Praia de Botafogo: 107.296 veículos por dia.
Vinte milhões de árvores para neutralizar efeito
Outra conseqüência do crescimento da frota é o aumento da poluição. Um estudo feito pela ONG Iniciativa Verde concluiu que a quantidade de CO2 (dióxido de carbono, oriundo da queima de combustíveis) lançado na atmosfera do Rio aumentou 16% de 2002 até 2007. Para neutralizar as 3.219.546,56 toneladas de CO2 que serão emitidas este ano, seria necessário plantar 20.333.978 árvores, o equivalente ao Parque Estadual da Pedra Branca, o maior do município, com 12.500 hectares.
— O aumento de 16% em cinco anos é grande, se formos pensar que o mundo faz um esforço contrário para reduzir as emissões — diz o biólogo Roberto Strumpf, diretor de Meio Ambiente da Iniciativa Verde.
Com 36 anos de profissão, o taxista Carli da Silva Gomes, de 60 anos, vem acompanhando a evolução do número de automóveis e diz que o trânsito está cada vez mais desorganizado.
— Há 30 anos, o trânsito era confuso, mas em poucas horas do dia. Hoje, é o dia todo. A Avenida Brasil e a Linha Vermelha são insuportáveis — afirma ele, apontando o uso do gás natural veicular (GNV) como um fator que estimula o aumento do número de carros. — Com R$ 10, a pessoa vai trabalhar a semana inteira de carro. O trânsito, com isso, fica péssimo.
Para o professor de engenharia de transportes da Coppe/UFRJ Paulo Cezar Ribeiro, os congestionamentos devem, aos poucos, ter a duração ampliada, até não haver mais horário sem engarrafamento.
— A previsão que se faz, em nível mundial, é de se ter um carro de passeio para cada dois habitantes. Em algumas partes do Rio, como a Zona Sul e a Barra, esse índice já foi atingido, mas, no geral, a cidade ainda está abaixo disso (a média é de um carro de passeio para cada 3,7 habitantes). Quando chegarmos ao patamar previsto, e isso inevitavelmente acontecerá, poderemos viver uma situação comparável com a de São Paulo — afirma.
Um dos motivos para isso, segundo o engenheiro da UFRJ Fernando Mac Dowell, é o fato de a malha viária do Rio não estar acompanhando o crescimento do número de veículos.
A última grande obra, a Linha Amarela, vai completar dez anos em novembro.
— A infra-estrutura do Rio, historicamente, é deficitária e vem a reboque. As linhas Amarela e Vermelha levaram mais de 20 anos para sair do papel. Nossa vantagem sobre São Paulo, por enquanto, é que só 55% da nossa frota estão na rua diariamente, pois o carioca anda mais de transporte coletivo que o paulistano. Com o aumento do poder aquisitivo da população, no entanto, e a falta de obras, corremos o risco de ver a situação se agravar — afirma ele.
Diante da situação, Guerra defende a priorização dos investimentos em transporte público, de modo a estimular as pessoas a deixarem os carros em casa: — Em vez de adaptar a cidade ao automóvel, temos que adaptar o automóvel à cidade.
Entendimento parecido tem o prefeito Cesar Maia, que também enxerga a possibilidade de o trânsito ficar cada vez mais complicado.
— Olhando para os últimos dez anos, e projetando para a frente, os problemas de estresse no trânsito, tipo São Paulo, chegarão progressivamente ao Rio em mais dez anos — estima.
Entre os projetos que considera essenciais, Cesar cita a ligação direta do metrô de São Cristóvão à Central; a implantação do corredor de ônibus T5 (Barra-Penha), atualmente em licitação; a melhoria da qualidade dos trens da SuperVia, de modo a atrair mais passageiros; a multiplicação das integrações de ônibus com trem e metrô; a redefinição das linhas de ônibus; e a autorização para a construção de uma terceira boca de túnel no Viaduto do Joá.
Fonte: Jornal O Globo - 02/09/07
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