Apresentação

Gerar, disseminar e debater informações sobre Desordem Urbana, sob enfoque de Saúde Pública, é o objetivo principal deste Blog produzido no Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde - LabConsS da FF/UFRJ, com apoio e monitoramento técnico dos bolsistas e egressos do Grupo PET-Programa de Educação Tutorial da SESu/MEC.

domingo, 14 de junho de 2009

Um País na Contramão

Colunista Convidado do Jornal O Globo - Cecil Thiré*

Muitas são as lacunas que, infelizmente, caracterizam a nossa educação. Quanto às regras de circulação e direito de passagem, somos muito incultos e deseducados. Quanto a vários outros quesitos, também... Apenas não somos os únicos grosseirões ambulantes das Américas. Mas vamos começar por nossa casa, nosso país, nossa gente, nossa cidade.

É notória a truculência no trânsito cultivada por nossos motoristas, a má vontade em parar diante de um sinal vermelho, o impulso de acelerar diante do amarelo, o absurdo de preferir a faixa da esquerda da pista dupla (ou tripla) para trafegar! A esquerda é reservada para as ultrapassagens! A Lei Seca que não pegou; a proibição de falar ao celular que é solenemente ignorada por nossos motoristas, que se distraem pelos ouvidos e seguem vacilantes pela pista em velocidade abaixo do trânsito em geral etc. etc. etc. Não deixando de lado a arrogância dos motoqueiros, que transformaram o espaço entre as fileiras de carros em pista de rolamento e se julgam com preferência de passagem sobre os demais veículos, vindo em uma velocidade sempre superior à do tráfego – saindo, portanto, “do nada”- e enfiando o dedo em suas buzinas agudas e enervantes.

Duvido que esse meu desabafo não tenha ressonância e a simpatia de muita gente. Um pouco mais de civilidade, amigos motoqueiros. Mas, infelizmente, civilidade não parece ser o nosso forte.

Já sou avô, mas quando vou chegando à porta, raro é o jovem (ou a jovem) que me dá passagem. Em vez disso, quase sempre, se apressam e cortam a minha frente. Em nenhum lugar nos ensinam a andar ordeiramente pelas calçadas. Deveríamos tomar o lado direito do sentido em que nos deslocamos, mas isso ninguém ensina. O mais apressado deveria usar o lado esquerdo da calçada para ultrapassar um menos apressado, como um automóvel, mas isso, em lugar nenhum, nos ensinam. O cúmulo acontece em nossas escadas rolantes! A julgar pelo comportamento dos brasileiros em geral, poderíamos achar que é proibido subir ou descer os degraus de uma escada rolante em movimento. As pessoas correm, passam a nossa frente, chegam à escada rolante e param no meio dela, bloqueando qualquer tipo de ultrapassagem. Uma vez, na França, levei uma enérgica bronca de uma senhora: “Mantenha a sua direita!” Aprendi.

Mas voltemos à calçada. Quando fui renovar minha carteira de motorista, tive que estudar as leis de trânsito e fiquei surpreso por ver escrito que ciclista na calçada deve andar a pé, ao lado da bicicleta, conduzindo-a pelo guidão! Ninguém parece saber disso! É só dar uma caminhada pela Avenida Ataulfo de Paiva em hora útil e ver! Homens e mulheres “bicicleteiam” pelas calçadas, desviando dos transeuntes! Isso quando desviam, pois acontece de virem para cima da gente. Nota-se certa má vontade para com os pedestres. Vê-se pela fisionomia dos que pedalam, que nem sequer imaginam que a calçada é para os que estão a pé. Dia desses, ao atravessar pela faixa de pedestres, com o sinal aberto para mim, passou um ciclista pela faixa - com o sinal fechado para ele -, na contramão da Avenida Bartolomeu Mitre. Eu, com bom humor, disse: ”Na contramão você acaba pegando um!” Ele parou na esquina e riu bastante aqui do otário.

Um enérgico fiscal da prefeitura, numa reportagem de TV, cortava o cabo de aço que prendia uma bicicleta no poste. Radical! Mas quanto a pedalarem nas calçadas, nada. Nem um aviso, nem uma campanha educativa ou choque de ordem. Quanto às bicicletas na contra mão, justo quando quem atravessa a rua está olhando para o lado de onde vêm os carros? Nada. Nenhuma fiscalização.

“Também”, penso, “são poucas as ciclovias, os carros ameaçam os ciclistas.” Então, o que fazer? Não sei, enquanto não pega a moda de civilidade, a gente vai desviando, se virando. Boa sorte!

*Cecil Thiré é ator

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